sábado, 6 de dezembro de 2008

NO CENTRO DA TRAGÉDIA

Hoje estive na zona vermelha. É a área do Vale do Itajaí onde o Exército bloqueou a estrada e não permite a passagem dos moradores. O risco de novos deslizamentos no local ainda pode persistir por uma temporada, disse o comandante da operação. Não é exagero. Quando cruzamos a fronteira entre a tragédia que todos podem ver e aquela que é controlada, encontramos imagens que nem parecem reais.

A localidade de Braço do Baú está deserta. Casas, restaurantes, supermercados. Tudo foi deixado para trás por quem conseguiu sobreviver. A lama invadiu as construções como se fosse água. E em alguns lugares, endureceu. Em outros, parece areia movediça. Chega um ponto em que o carro da Polícia Militar, que nos guiava, precisa parar. Não há mais estrada. Quinze dias depois da enchente, um rio corre no meio das casas, como se fizesse parte do cenário. Nunca foi. É um invasor. Ali, no fim da zona vermelha, as casas estão amontoadas. Pedaços de carro retorcidos aparecem nas garagens. O único som que se ouve é o da água que ainda corre vinda dos morros.

A polícia permite que alguns moradores busquem documentos e animais deixados na área. Mas isso precisa ser feito entre sete horas da manhã e sete da noite. Se o tempo fechar, eles devem se retirar imediatamente.

Antes de partirmos, no final da tarde, avistei um cachorro sobre uma casa cercada de lama. Um sobrevivente cansado. Há quantos dias estava lá em cima? Por quanto tempo seria capaz de sobreviver? A casa ficava em um local onde nem o resgate chegou. A lama tem mais de três metros de profundidade. Só será possível chegar até lá quando ela endurecer. Se endurecer. Os moradores querem que o resgate procure os corpos ainda desaparecidos naquele local. Eles não vão. Ninguém pode mergulhar na lama e nem caminhar por ela. Tudo parece uma grande lagoa, de barro. E ela pode explodir, disse um dos policiais. Se isso acontecer, irá cobrir o restante das casas, já destruídas. O cachorrinho do teto desistiu de latir. Sumiu do outro lado. Jamais vou saber se encontrou um galho de árvore, uma pedra para descansar. Ou se desistiu de esperar ajuda e afundou para sempre no lugar onde nem os bombeiros chegam.

2 comentários:

Marcia disse...

é tudo muito triste.
ser jornalista, nestas horas, nos dá uma amplitude de visão que muda tudo por dentro.

te cuida.

TatiPy disse...

Ai, que tristeza!